domingo, 27 de janeiro de 2013

ECOS E FLASHS DOS ANOS DE CHUMBO 2





Por Cássio Ribeiro

João Goulart já estava fora da presidência do Brasil no dia 1º de abril de 1964. O cargo foi assumido pelo líder da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, mas para o Golpe Militar ficar "completo", e fazer jus ao nome, era preciso preencher a presidência da República com um general. Uma semana depois, o comando do Golpe decretou o primeiro de uma série de atos institucionais que seriam os principais instrumentos de repressão e imposição da ditadura militar brasileira.


O Ato Institucional Número 1 (AI-1) cerceou o direito do povo votar para eleger o novo presidente. Coube ao Congresso Nacional, coagido é claro, escolher no dia 15 de abril de 1964, o chefe do Estado-maior do Exército, General Castello Branco, para ocupar o lugar que João Goulart deixou ao ser deposto.


No mesmo "pacote" de medidas do (AI 1), ocorreram cassações de mandato e o fechamento de instituições consideradas "subversivas", como o CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), as Ligas Camponesas e a UNE (União Nacional dos Estudantes). Os líderes dessas organizações foram presos e mandados para o exílio.



Curiosamente, o ex-presidente Juscelino Kubitskchek, que governou o Brasil entre 1956 e 1961, apoiou a escolha de Castello Branco para a presidência. Por ter promovido Castello ao posto de general-de-divisão quando governava o Brasil, Juscelino acreditava que o General o apoiaria nas eleições presidenciais que estavam previstas para 1965. Porém, dois meses depois de ser escolhido como novo presidente, Castello Branco cassou os direitos políticos de Juscelino Kubitskchek, que foram suspensos por 10 anos.



General Castello Branco: primeiro presidente da Ditadura Militar

O mandato do general Castello Branco deveria durar de 15 de abril de 1964 até 20 de janeiro de 1966, mas foi estendido até 15 de março de 1967. Estava garantido assim, o poder nas mãos da chamada Linha Dura, que defendia a manutenção inabalável das características da "Revolução", além de acabar com qualquer vestígio remanescente da ideologia do regime democrático deposto.
 

Em 27 de outubro de 1965, foi promulgado o Ato Institucional número 2 (AI-2), que deu poderes excepcionais ao presidente, como cassar mandatos políticos e decretar estado de sítio sem autorização do congresso. Alem disso, o AI-2 acabou com os partidos políticos existentes e formalizou o modelo de eleição indireta para presidente, sem participação do povo na escolha. No lugar dos antigos partidos, nasceram apenas dois com a permissão da Ditadura Militar: A Arena (Aliança Renovadora Nacional), que apoiava o governo, e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), de oposição à Ditadura.
 

No dia 3 de outubro de 1966, foi realizada eleição indireta no Congresso Nacional para a escolha do sucessor de Castello Branco. Sem a presença de nenhum integrante do MDB, que boicotou a escolha já definida antes mesmo da votação, os representantes da ARENA elegeram o general Costa e Silva como novo presidente do Brasil.


Costa e Silva: segundo general-presidente, que pôs em vigor o AI-5

Costa e Silva assumiu em 15 de março de 1967, ano em que também entrou em vigor uma nova Constituição, na qual figurava a Lei de Segurança Nacional e a Lei de Imprensa, além da garantia de poderes praticamente ilimitados ao novo presidente. Com isso, a oposição passou a questionar a Constituição, que afirmava ser a "formalização da Ditadura".



Surgiram então vários protestos em diversas partes do Brasil. O Centro da cidade do Rio de Janeiro foi o cenário de vários desses protestos. Na tarde de 28 de março de 1968, policiais militares foram chamados para reprimir um protesto de estudantes perto do aeroporto Santos Dumont. Os manifestantes reagiram com pedradas. No meio da confusão generalizada, o estudante Edson Luiz de Lima Souto foi baleado no peito por um tiro disparado por um dos policiais que agiam contra os manifestantes. 
 


O corpo de Edson Luiz foi levado para a Câmara dos Vereadores e colocado sobre uma mesa. 50 mil pessoas acompanharam o enterro no dia seguinte. No dia 4 de abril de 1968, depois de uma missa em memória do estudante morto, foi organizada a chamada Passeata dos Cem Mil, que foi liderada por personalidades como Chico Buarque, Tonia Carrero e Clarice Lispector.




Passeata dos Cem Mil: as manifestações ...



e a resistência contra o regime acabaram desencadeando o aumento da violência por parte da repressão




Na mesma proporção da grandiosa passeata dos Cem Mil, crescia a violência policial do regime. Tornaram-se rotina as invasões de universidades e as prisões de estudantes. Em outubro de 1968, foi organizado um congresso para a reestruturação da extinta União Nacional do Estudantes (UNE). Porém, a repressão mostrou seu poder outra vez ao acabar com o congresso, prendendo seus participantes.


Qualquer manifestação contrária ao regime significava espancamento e prisão


O clima de instabilidade pública levou a linha dura da Ditadura ao ponto de optar pelas articulações de atitudes repressivas extremas, expressas, por exemplo, pela atitude do brigadeiro João Paulo Burnier de tentar transformar o Para-Sar, que é uma instituição da Aeronáutica responsável por salvamentos e resgates, num instrumento terrorista para eliminar pessoas contrárias ao Regime Militar. (Fonte: Jornal do Brasil).


A esquerda também se organizava, representada pela ala radical do Movimento Estudantil. Apesar de o Partido Comunista Brasileiro ter sido contra a luta armada, surgiram diversas organizações de resistência cujas ideologias eram norteadas pela socialização comum dos mecanismos públicos, políticos e habitacionais.



Em setembro de 1968, o deputado federal Márcio Moreira Alves, do MDB, fez um discurso pedindo ao povo que não fosse às festividades do Dia da Independência, num ato de protesto ao Regime Militar. Ofendidos, os militares pediram ao governo para processar o deputado, porém, o pedido foi negado pelo congresso, em 12 de dezembro de 1968. No dia seguinte, era entregue ao Conselho Nacional de Segurança, o texto do Ato Institucional número 5 (AI-5), que é considerado o golpe dentro do golpe.



No AI-5, o Congresso Nacional foi dissolvido e posto em recesso por tempo indeterminado. A liberdade de qualquer pessoa podia ser vigiada, havia a proibição de determinados lugares serem frequentados, a suspensão de direitos políticos, a proibição de qualquer direito público ou privado. Ir e vir perdeu o sentido prático. Toda e qualquer manifestação de oposição ao Regime Militar estava severamente proibida. A imunidade parlamentar foi extinta, e entraram em vigor a prisão perpétua e a pena de morte.




A prática da tortura e do assassinato de opositores foi regulamentada e institucionalizada. O Exército criou a Operação Bandeirante (Oban), chamada depois pelo temido nome de DOI-Codi, localizada na rua Tutóia, em São Paulo. No Rio de Janeiro, o endereço das torturas e dos assassinatos ficava no quartel da Polícia do Exército (PE), à rua Barão de Mesquita, na Tijuca. Militares do Exército e policiais comuns se uniam para a prática da tortura, sendo pendurando suas vítimas no pau-de-arara, sendo desferindo-lhes potentes choques por todo o corpo, incluindo regiões genitais.
 

O general Emílio Garrastazu Médici assumiu a presidência em 30 de outubro de 1969, num cenário em que não havia mais as manifestações públicas estudantis, e nem a oposição dos políticos do MDB. A oposição ao Regime Militar, seja ela radical ou moderada, estava severa e totalmente proibida.




Na contra mão do radicalismo das torturas e proibições ocorridas a partir do AI-5, surgiram organizações de guerrilha da Esquerda, cuja prática da luta armada, ou sua tentativa, foi a principal característica.



Sob influência do romantismo da Revolução Cubana (1959), que tangia a figura do guerrilheiro com uma aura mística, surgiram as primeiras organizações brasileiras de guerrilha urbana: A ALN (Aliança Libertadora Nacional), liderada por Carlos Marighela, o MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro), dia da morte de Che Guevara na Bolívia, e a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), liderada pelo ex-capitão do Exército, Carlos Lamarca. Para essas organizações, quase totalmente formadas por jovens estudantes, a luta armada era a única forma de derrubar a Ditadura Militar.






 
Carlos Lamarca ainda como capitão do Exércido, dando instruções de tiro para funcionárias bancárias. Curiosamente, a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), liderada por Lamarca, executaria posteriormente assaltos bancários para financiar suas ações de combate armado à ditadura militar. Lamarca também desviava fuzis do Exército Brasileiro para serem usados nas atividades de guerrilha da VPR




"LAMARCA, O CAPITÃO DA GUERRILHA"  ( FILME COMPLETO) 





TERRORISTA LAMARCA PROMOVIDO A GENERAL - DEP JAIR BOLSONARO NA TV CÂMARA 
 


Os grandes erros dessas instituições de oposição à Ditadura foram a fragmentação das forças, sem uma unidade e um comando nacional forte, e a falta de experiência de seus integrantes com as armas de fogo, tão familiares e usadas de forma costumeira pelos integrantes da Ditadura Militar e seus soldados defensores.



A principal ação da Guerrilha urbana foi o seqüestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, realizado em 1969, pela Aliança Libertadora Nacional (ALN) e pelo Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8). O embaixador foi trocado pela soltura de 70 presos políticos, relacionados numa lista publicada nos veículos de comunicação da época.


70 presos políticos prestes a deixarem o Brasil em janeiro de 1971


A incisiva violência da Ditadura Militar foi o bastante para acabar com a luta armada contra o regime. Os chefes das organizações revolucionárias foram caçados e mortos um a um. Carlos Marighela foi eliminado em 1969, além de Lamarca, o último líder guerrilheiro de expressão nacional, morto no sertão baiano em setembro de 1971.



Para o jornalista e Ex-Deputado Federal Fernando Gabeira, que integrava o MR-8 e participou da ação de sequestro do embaixador norte-americano, a concentração das organizações armadas no meio urbano foi um erro:


"A revolução chinesa, que influenciou a guerrilha do Araguaia, via no camponês um sujeito revolucionário e propunha o cerco das cidades pelo campo. O correto, então, era sacudir o interior do país, formar um autêntico exército revolucionário, que cercaria as cidades. Estas, envoltas em sua crise, e com a ajuda de pequenas insurreições, acabariam caindo de maduras.

A esquerda brasileira era, na sua esmagadora maioria, composta de quadros urbanos. Sua grande e quase impossível tarefa era instalar-se no interior, adaptar-se ao terreno e conquistar corações e mentes. Algumas ações urbanas foram realizadas com êxito, mas a passagem mesmo da cidade para o campo, que era o sonho de muitos, nunca se consumou de todo.


Talvez seja por isso que um documento da época tenha concluído, com entusiasmo religioso, que a morte de Carlos Lamarca no interior da Bahia tinha um aspecto positivo: pelo menos já estamos morrendo no campo", Disse Gabeira.




 Fernando Gabeira



Outra ação característica da Ditadura Brasileira após o AI-5 foi a censura imposta aos veículos de comunicação. Em toda redação de jornal era comum a figura do censor, que trabalhava para a repressão, e analisava cada matéria antes da publicação da edição do dia seguinte. Muitas verdades não podiam sair e, jornais como O Estado de São Paulo publicavam receitas nos lugares das matérias censuradas, como forma de protesto diante das proibições que ceifavam a liberdade de imprensa e o dever de publicação da verdade.




Receitas de doces e salgados nos lugares das matérias censuradas

Ainda em 1968, numa famosa e inesquecível primeira página do Jornal do Brasil, o editor Alberto Dines usou um certo jogo de cintura para não chamar a atenção dos censores ainda inexperientes. O espaço dedicado às informações do clima na primeira página apresentou turbulências e temporais de bom tamanho como previsão do tempo.



Outros jornais da época publicavam figuras de monstros nos lugares das páginas que deveriam ter sido ocupados por matérias censuradas. Peças de teatro, músicas, filmes e todos os tipos de manifestações culturais sofreram intensa censura nos Anos de Chumbo. O filme "Dona Flor e Seus Dois Maridos", do cineasta Bruno Barreto, foi acusado de fazer parte de uma estratégia comunista para abalar os costumes morais da sociedade e da família brasileira.


No campo econômico, político e social, a Ditadura Militar Brasileira foi caracterizada pela exclusão da maioria. A má distribuição de renda e sua concentração nas mãos de poucos foi o retrato administrativo da Ditadura. O golpe militar de 1964 e as administrações posteriores da Ditadura foram um ajuste político e econômico do Brasil no jogo dos novos interesses do capitalismo internacional.




Isso é bem caracterizado pela escolha dos primeiros ministros da área econômica da ditadura militar, todos eles vinculados ao capital internacional ou às empresas multinacionais: Roberto Campos e Otávio Golveia de Bulhões, respectivamente ministros do Planejamento e da Fazenda do governo Castello Branco por exemplo.






As medidas adotadas pelos ministros de Castello Branco foram tomadas como se no Brasil houvesse apenas grandes empresas. As pequenas e médias, geralmente de propriedade de brasileiros, quebraram economicamente ou se mantiveram com extrema dificuldade.






Para os trabalhadores, o FGTS (Fundo de Garantia Sobre Tempo de Serviço) substituiu a estabilidade no emprego que era adquirida por um trabalhador depois de dez anos trabalhando no mesmo lugar. O FGTS promoveu a "rotatividade da mão de obra", onde os mecanismos de dispensa de trabalhadores e a contratação de outros com salários menores foi facilitada.


O chamado "milagre econômico" da Ditadura Militar foi baseado no aumento vertiginoso da Dívida Externa para a obtenção de tecnologia estrangeira, e na concentração desigual para promover o consumo de produtos industrializados.






Numa comparação do aumento da dívida externa entre 1940 e 1964, que passou de 2 para 2,5 bilhões de dólares, num crescimento de 25%, é alarmante o aumento da mesma dívida verificado entre 1964 e 1978, que passou de 2,5 para 40 bilhões de dólares, num crescimento de 1500%.




Rodovia Transamazônica: faraônico projeto da Ditadura que ficou famoso por ligar o "nada ao lugar nenhum".




Já o mercado de consumo dos produtos industrializados produzidos no Brasil (televisões, rádios, geladeiras e automóveis) era formado por cerca de 5 milhões de pessoas de altíssima renda (a chamada elite burguesa), e mais 15 milhões de pessoas que puderam participar do "consumismo" mediante extremo sacrifício, graças à expansão do crédito ao consumidor. Esse mercado de consumo excluiu o restante da população, cerca de 80 milhões de brasileiros das classes menos favorecidas.



O modelo econômico da Ditadura Militar Brasileira pode ser definido então como uma "industrialização excludente" que endividou o Brasil no exterior de forma nunca antes observada na história do País.



O general Ernesto Geisel assumiu a presidência em 15 de março de 1974, época em que o "Milagre Econômico" da ditadura entrou em declínio devido aos esgotamentos internos dos limites de crescimento, e às mudanças do mercado internacional. 



A crise econômica do regime se somou às pressões pela abertura política e pela anistia aos exilados no exterior. Um triste fato foi marcante na guinada que levou o Brasil, de forma lenta e gradativa é claro, de volta aos moldes democráticos de liberdade.

 

O jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, então diretor de jornalismo da TV Cultura de São Paulo, foi preso e levado às masmorras de tortura do DOI-Codi, na Rua Tutóia, em São Paulo, onde foi cruelmente assassinado sob acusações de ser militante comunista, e porque o telejornal da TV Cultura era o único que veiculava matérias com assuntos verdadeiros sobre os fracassos econômicos e sociais da Ditadura Militar.

 

O comandante do II Exército, general Ednardo D’ávilla Mello, representante da Linha Dura, divulgou uma nota um dia após a morte de Vlado, em 26 de outubro de 1975, afirmando que o jornalista havia se suicidado. Numa das fotos da cena da morte, publicada posteriormente, o corpo enforcado encontra-se de joelhos, indício que reforçou a comprovação de uma suposta armação da cena do suicídio, depois que Vlado foi assassinado durante as sessões de tortura.




O cinto usado no suposto "enforcamento suicida" não podia ser portado por nenhum prisioneiro do DOI-Codi. Foram observadas também duas marcas de enforcamento, o que remete à hipótese mais provável de estrangulamento.





Dois momentos de Vlado no DOI-Codi: primeiro atordoado pela humilhação e pela tortura ...

e no suposto "enforcamento suicida"
 




O quinto e último presidente da Ditadura Militar, General João Baptista Figueiredo, assumiu a Presidência em 15 de março de 1979 e, até 15 de março de 1985, pôs em prática a lenta conclusão da abertura política iniciada pelo General Geisel, no governo anterior.




General João Baptista Figueiredo



Figueiredo teve que enfrentar o grupo de militares da Linha Dura, que se opunham ao processo de abertura. Esses militares executaram o chamado "Terrorismo de Direita", a fim de culpar uma suposta esquerda perigosa, que ameaçaria tomar o poder em caso de abertura. Esses militares da linha dura também temiam revanchismo contra eles, depois que o Estado de direito e a democracia fossem restaurados no Brasil.



Os atos terroristas tiveram início em 1980, quando em São Paulo e Minas Gerais bancas de jornal e revista foram incendiadas. Em julho de 1980, durante a visita do papa João Paulo II ao Brasil, O jurista Dalmo Dallari, que discursaria na presença do papa, foi sequestrado e espancado por desconhecidos.



Em 30 de abril de 1981, ocorreu a mais violenta ação terrorista da Direita. Enquanto 20 mil pessoas assistiam quietas a um show musical promovido pelo Centro Brasil Democrático (Cebrade), uma potente bomba detonou no estacionamento, sobre o colo do sargento do Exército Guilherme Pereira do Rosário, que morreu na hora. O capitão Wilson Machado, que dirigia o automóvel Puma de chapa "fria" em que ambos se encontravam, foi gravemente ferido mas sobreviveu. Uma segunda bomba foi colocada na casa de força do estacionamento, mas não explodiu.



O carro em que os dois militares estavam ficou completamente destruído, mas o atentado do Rio Centro jamais foi totalmente esclarecido



Apesar da notória evidência de que os militares vitimados pela bomba eram os terroristas, um relatório oficial divulgado pelo Exército apresentou os dois como vítimas de terroristas desconhecidos. O caso foi encerrado sem que os responsáveis jamais fossem punidos.



Em 1984, a campanha pelas eleições diretas para a escolha do novo presidente reuniu 1 milhão de pessoas no dia 10 de abril, no Rio de Janeiro, e 1 milhão de pessoas em 16 de abril, em São Paulo. Toda essa mobilização era em prol da aprovação da emenda Dante de Oliveira pelo Congresso, que restabeleceria a eleição direta para presidente da República.




1 milhão de pessoas reunidas na Candelária, no Rio de Janeiro, em 1984, durante o Comício das Diretas



Em 25 de abril de 1984, o PDS, presidido por José Sarney, foi fiel à ditadura e a emenda Dante de Oliveira acabou rejeitada pelo Congresso Nacional. Em novembro de 1984, a eleição indireta para presidente, realizada por meio de votação interna no Colégio Eleitoral, escolheu o civil Tancredo Neves, do PMDB, como novo presidente do Brasil.


Tancredo derrotou o candidato do PDS, Paulo Maluf, na disputa. Em 14 de março de 1985, um dia antes de sua posse, Tancredo foi submetido a uma operação às pressas no Hospital de Base de Brasília. Complicações se sucederam e o presidente foi operado 7 vezes. Depois de 39 dias internado, Tancredo Neves faleceu em 21 de abril de 1985.


Tancredo Neves



José Sarney



Ironicamente, a "Nova" República", como Tancredo Neves chamou o período que teria início com seu mandato, acabou tendo o vice de Tancredo, José Sarney, como seu primeiro presidente. O mesmo Sarney que liderou, em abril de 1984, a rejeição da emenda que propunha a escolha do novo presidente pelo povo.

Começava ai, de forma curiosa e inesperada, uma nova fase da História do Brasil, com seus mensalões, propinas e getons; um Brasil do literalmente "Você Sabe Quem Eu Sou!"

domingo, 20 de janeiro de 2013

A EXPLOSÃO DO ÔNIBUS ESPACIAL CHALLENGER






Por Cássio Ribeiro

Embora os russos tenham dado o primeiro passo da corrida espacial, enviando o primeiro homem, Yuri Gagarim, em 1961, a um ponto orbital além da atmosfera do planeta Terra, os americanos acabaram passando a frente na busca pelo domínio sobre a ida ao espaço e sua ocupação.

Tudo estava pronto no Centro Espacial Kennedy, em Cabo Canaveral, Flórida, para o lançamento da 25ª missão da Agência Espacial Norte-Americana (NASA). Estacionado na recém-reformada plataforma 39 B, o ônibus espacial Challenger está preso a dois foguetes modelo SRB, fabricados pela empresa Morton Thiokol.


Tudo pronto para mais um lançamento em Cabo Canaveral, na Flórida



Desde o primeiro lançamento do programa espacial dos Estados Unidos, realizado em 1981, o interesse do público americano sobre as atividades da NASA diminuiu bastante, e a opinião pública parecia ter perdido a consciência sobre a magnitude do projeto.


O lançamento da Challenger era encarado como rotina no ponto de vista técnico, porém, uma novidade nessa missão fazia a imprensa voltar sua atenção para o lançamento como em nenhuma das outras 24 investidas anteriores da NASA ao espaço.


Na missão da Challenger, foi posto em prática um esforço do governo do presidente Ronald Reagan para levar um cidadão comum ao espaço e, com isso, promover a popularidade do programa espacial americano que havia diminuído desde o primeiro lançamento.
A professora de ensino médio Christa McAuliffe estava incluída entre a tripulação da Challenger, e disse na ocasião que antecedia o lançamento: “Uma das coisas que espero poder ensinar na sala de aula é que eles, os alunos, também fazem parte da História; que o programa espacial pertence a eles também, e pretendo aproximá-los da era espacial. Acho que nunca um professor esteve mais preparado para dar essas aulas. Venho preparando-as desde setembro e espero que todos estejam sintonizados no quarto dia para assistir a um professor dando aula a partir do espaço.” 
O ex-presidente Ronald Reagan, ...


e a professora Christa McAuliffe



O projeto da missão previa que Christa faria pouco abordo da Challenger. Só após o quarto dia no espaço, ela seria o centro das atenções ao ministrar duas aulas para seus alunos a partir do ônibus espacial.


O sucesso em despertar o interesse do público com a inclusão de uma pessoa comum nas missões espaciais já abria estudo para outras participações, incluindo jornalistas e operários nas próximas idas ao espaço.
O comandante da missão era o ex-piloto da força aérea americana, Francis Dick Scobee, que afirmou na ocasião antes do lançamento da Challenger: “É um prazer estar em Cabo Canaveral e participar de algo que se faz melhor aqui do que em qualquer lugar do mundo: o lançamento de veículos espaciais.”

O piloto era Mike Smith e a missão da Challenger foi seu primeiro vôo em um ônibus espacial. O Vôo contava ainda com mais quatro especialistas: Judy Resnik, Ellison Onizuka, Ron McNoir e Greg Jarvis. Porém, o foco da atenção da imprensa era a professora Christa McAuliffe.



Os sete astronautas da missão da Challenger. Em pé: Elison Onizuka, a professora Christa McAuliffe, o especialista em carga útil Greg Jarvis, Judy Resnik e, abaixados: o piloto Mike Smith, o comandante Francis Scobee e Ron McNoir



É 27 de janeiro de 1986 e os astronautas começam a embarcar na Challenger, onde aguardarão até às 9h37min, horário previsto para o lançamento. Os controladores de vôo só embarcam a tripulação depois de todo o sistema ter sido testado. As condições da tripulação abordo são desconfortáveis. São 8h30min e os sete astronautas estão na “sala branca”, que é a antecâmara da Challenger.

 
A equipe de apoio executa o travamento manual da cabine, mas a verificação do fechamento indica que algo está errado. A porta está trancada, mas o indicador de segurança mostra que não. Os técnicos verificam que a trava está posicionada corretamente, mas parece que o indicador de segurança está com defeito.

O programa espacial americano já havia enfrentado uma série de falhas técnicas e quase todo lançamento teve que lidar com problemas antes da decolagem, durante e após os vôos. A característica arrojada do programa espacial sempre levou a NASA até o limite evolutivo da tecnologia disponível.


Enquanto a tripulação espera o concerto do indicador de segurança dentro da Challenger, a velocidade do vento na plataforma de lançamento está em 8 metros por segundo, que é o ponto limite a partir do qual é preciso cancelar o lançamento. Ao ser removida a barra da entrada da cabine, é constatado que o pino de segurança está com defeito.
Para realizar o reparo, é preciso esperar até que uma furadeira seja entregue, pois nenhuma ferramenta que possa produzir faísca é guardada no local onde o combustível dos foguetes propulsores poderia ser inflamado antes do momento exato de ignição.

O lançamento previsto para o dia anterior, 26 de janeiro, já foi adiado em função da previsão de mau tempo, mas na prática não houve mau tempo. Em 27 de janeiro, as condições climáticas também eram preocupantes, além do defeito existente no travamento da porta da Challenger.


O defeito no travamento da porta da Challenger foi resolvido, porém, às 12h50min, o vento forte fez o controle da missão adiar o lançamento mais uma vez. Os sete astronautas deixaram a nave e retornaram aos alojamentos do centro de lançamento para descansarem. Meio milhão de dólares em combustível teve que ser retirado do tanque externo e desperdiçado.

Para chegar à sua órbita ao redor da Terra, a Challenger dependia dos foguetes SRB, que custavam 50 milhões de dólares o par e faziam o ônibus espacial subir a uma velocidade de 1600 metros por segundo.


Depois do lançamento, os SRB eram separados dos ônibus espaciais e caíam de pára-quedas no mar, de onde eram resgatados e levados novamente para a empresa fabricante, a Morton Thiokol, em Utah, para serem recondicionados e aproveitados em outro lançamento.


O ônibus espacial é um tipo de avião que, ao ser lançado, está acoplado a um grande tanque externo de combustível líquido (oxigênio e hidrogênio), em vermelho na ilustração.Os foguetes auxiliares SRB vão acoplados ao grande tanque de combustível vermelho ...



Dois minutos após o lançamento, o combustível sólido dos foguetes auxiliares SRB se esgota. Eles se detacam do conjunto e caem de pára-quedas no mar, de onde são recuperados e preparados para outro lançamento. Nove minutos após o lançamento, o ônibus espacial já está fora da atmosfera e o combustível do tanque externo vermelho se esgota. Ele se desprende do ônibus, caindo em direção à Terra. O tanque se incendeia e é destruído quando entra em contato com o atrito da atmosfera, sendo ele a única parte do conjunto que não é reaproveitada em outro lançamento. O ônibus espacial entra em órbita ao redor de nosso planeta e, quando termina a missão, volta à Terra e pousa como um avião comum


Momento em que os foguetes auxiliares SRB se destacam do ônibus espacial, caindo no mar. Pára-quedas acoplados nos bicos dos foguetes garantem um retorno suave e possibilitam que os SRB possam ser recondicionados e usados em outro lançamento

A Morton Thiokol forma um complexo de 40 quilômetros quadrados e marca a paisagem de Brigham City, em Utah. A empresa era a contratada da NASA para produzir os propulsores dos foguetes que impulsionam os ônibus espaciais.


Os SRB eram construídos em partes para que o transporte ferroviário de Utah até Cabo Canaveral fosse facilitado. As partes eram então reunidas perto da plataforma de lançamento.


Cada junção entre as partes dos foguetes SRB eram vedadas com imensos anéis de borracha. Esses anéis dilatavam-se para fechar as brechas entre as partes dos foguetes SRB durante os lançamentos, evitando assim o vazamento catastrófico de gás superaquecido.


Quando os SRB foram recuperados após o lançamento do ônibus espacial Discovery, na missão anterior a da Challenger, em 1985, ocorreu a suspeita de vazamento de gás superaquecido, que teria passado pelos anéis de vedação. Os engenheiros da Morton Thiokol concluíram que o vazamento foi ocasionado pelas baixas temperaturas que prejudicaram o funcionamento correto dos anéis de vedação, registradas antes do lançamento da Discovery.

Em Cabo Canaveral, a previsão indicava temperaturas abaixo de zero na virada do dia 27 para o dia 28 de janeiro de 1986, que era a nova data prevista para o lançamento da Challenger.


Os engenheiros da Morton Thiokol tentaram reunir provas de que a baixa temperatura prejudicava o funcionamento dos anéis de vedação dos foguetes SRB. Eles estavam certos de que o problema dos anéis já se configuava em temperaturas de 10 graus. A situação era ainda mais perigosa diante das temperaturas abaixo de zero registradas antes do lançamento da Challenger.


Para os engenheiros não havia outra alternativa senão adiar o lançamento até que a temperatura aumentasse. A NASA alegou que a influência da temperatura sobre os anéis de vedação jamais havia entrado em questão, e afirmou que outro cancelamento do lançamento estava fora de cogitação.


Em Cabo Canaveral, temperaturas abaixo de zero foram registradas assim que o Sol se pôs. Cristais de gelo começaram a se formar na plataforma de lançamento, configurando as condições que os engenheiros da Morton Thiokol tanto temiam antes do lançamento.


A reunião entre os engenheiros da Morton Thiokol chegou ao fim e todos estavam exaustos. Um deles, Roger Boisjoly, resolveu escrever um relatório:

“Depois de muita discussão, das 13h às 20h30, a recomendação dos engenheiros foi de que o vôo fosse adiado até que a vedação atingisse 12º C, de acordo com nosso banco de dados. A NASA não gostou das recomendações e nossos diretores formaram uma junta para votar uma decisão. O resultado foi que nosso diretor decidiu que o risco era pequeno, baseado no pressuposto de que a temperatura não era impedimento. Nós da engenharia, tentamos uma vez mais ressaltar que o problema era a programação do lançamento sob baixa temperatura. Espero sinceramente que esse lançamento não termine em uma catástrofe."


Faltam 11 horas para o lançamento, que está previsto para perto de meio-dia. É uma hora da manhã e são lançados 5300 litros de anticongelante na tentativa de impedir a formação de gelo nos foguetes e na Challenger.

Apesar dos atrasos, a missão da Challenger já havia garantido grande publicidade para a NASA e para o governo Reagan, que promoveu a inclusão de uma professora no programa espacial. Christa McAuliffe foi selecionada após uma semana de testes rigorosos aplicados aos 10 finalistas escolhidos num total de 11 mil professores que concorreram.


O público ficou entusiasmado com a história de uma esposa comum, professora e mãe de dois filhos, levada ao espaço: “Quando o ônibus espacial partir, haverá um só corpo, mas levarei comigo 10 almas”, disse Christa.



Outro registro dos sete astronautas antes do lançamento

São 6h18 do dia 28 de janeiro e os sete astronautas da Challenger acordam. O controle da missão avisa que poderá haver atrasos causados por problemas de temperatura. Uma equipe continua a limpar o gelo ao redor da plataforma de lançamento.

Enquanto a professora Christa se prepara para embarcar, os técnicos a presenteiam com uma maçã. Ela devolve a fruta e diz: “Guardem para mim. Vou comê-la quando voltar.”

A contagem regressiva marca os últimos 9 minutos. No local do lançamento, o tempo está limpo e frio. Jay Green controla a missão de lançamento a partir de Houston. Ele se encontra com os 11 membros de sua equipe e todos gritam: “Vamos lançar!” A contagem regressiva de 9 minutos é iniciada. A torre de controle diz: “verificando a pressão do oxigênio líquido”.

Faltando 10 segundos para a subida, jatos d’água são lançados para abafar o barulho do lançamento. A ignição dá início à inflamação dos gases congelados dos motores. A força é tão intensa que faz o ônibus espacial chacoalhar na plataforma. Quando volta à posição inicial, a Challenger é lançada. Uma voz exclama a partir do centro de controle: “É a 25ª missão de lançamento e já deixa para trás a torre da plataforma.”


Lançamento da Challenger


A cada segundo de subida, o foguete queima 10 toneladas de combustível sólido. Ao chegar aos 6 mil metros de altitude, os três motores principais da Challenger reduzem a velocidade a 65%, antecipando-se a carga de estresse que os engenheiros chamam de Q máximo, que é a pressão aerodinâmica máxima.

Quando a Challenger chega aos 15 mil metros, os motores são novamente exigidos em potência máxima. A torre comunica: “Três motores agora em 104%. Challenger, prossiga com propulsão total”. O piloto responde: “Aumentando propulsão!”

Nesse instante, a quase 17 mil metros, o vazamento de gás superaquecido que passa pelos anéis de vedação defeituosos faz o foguete SRB explodir. A Challenger e seus sete astronautas se desintegram em pleno ar. A marcante imagem de um Y no céu é formada após os restos dos foguetes auxiliares saírem voando descontrolados, antes de serem destruídos por controle remoto 30 segundos após a explosão.




No primeiro quadro, a seta branca mostra o vazamento de gás superaquecido em tom mais claro. No segundo quadro, o vazamento é bem maior e ocasiona a catastrófica explosão que faz os restos dos foguetes auxiliares SRB sairem voando ...


em duas direções, formando a impressionante imagem de um imenso Y no céu, ...


antes de caírem e serem destruídos por controle remoto


A explosão foi assistida ao vivo pelos alunos da professora Christa, em um telão na escola onde ela trabalhava em Concorde. A equipe de salvamento se apressou nas buscas imediatamente após o acidente, mas não havia sobreviventes.


A comissão de inquérito decidiu que os diretores da NASA não estavam cientes das questões levantadas pela fabricante Morton Thiokol. Também foi concluído que a Morton não apoiou a opinião de seus engenheiros, voltando atrás de sua posição diante das pressões da NASA.









domingo, 13 de janeiro de 2013

O CAFÉ NO CORPO HUMANO





Por Cássio Ribeiro

O primeiro estímulo do café sobre o corpo humano ocorre através do olfato. No momento em que os grãos são torrados, ou durante o preparo do café, quando o pó entra em contato com a água quente, várias substâncias voláteis presentes no café, como proteínas, aminoácidos, lipídeos e açúcares, formam quase mil compostos que saem pelo ar espalhando o original e inconfundível cheiro convidativo da bebida.



Embora o café também apresente zinco, ferro, magnésio e potássio em sua composição, a cafeína é a principal responsável pelos efeitos da bebida sobre o corpo humano.

 

Assim como a teofilina no chá, a teobromina no cacau e a cocaína na folha de coca, a cafeína também pertence ao grupo dos alcalóides vegetais, que são estimulantes do sistema nervoso central chamados de xantinas, responsáveis por estados de alerta de curta duração nos indivíduos.






Separada dos grãos de café, a cafeína pura tem o aspecto de um pó branco, amargo e extremamente solúvel em água. A estrutura molecular da cafeína é muitíssimo parecida com a da adenosina, que é uma substância natural do cérebro liberada pelos neurônios.



Como é muito parecida com a adenosina, a cafeína ocupa seu lugar na ligação com os neurônios, impedindo que a atividade elétrica das células cerebrais fique lenta. "Para alguns indivíduos, a cafeína está relacionada com a melhora dos níveis de atenção, sensação de bem-estar e aumento da disposição", explica Maria de Fátima Ferreira, nutricionista do INCOR (Instituto do Coração) de São Paulo.




No geral, as reações apresentadas por quem ingere a cafeína são a melhora da atividade intelectual, clareza do raciocínio, aumento da velocidade das associações de idéias, exaltação das fantasias, sensação de bem-estar, agilidade no tempo de reação e reflexo, além da redução da sonolência e da fadiga. O pico dos efeitos da cafeína ocorre entre 30 e 60 minutos após a ingestão, e pode durar entre 3 e 10 horas.




O bebedor habitual de café tem o organismo adaptado, por meio da tolerância, às alterações que a bebida causa no equilíbrio natural do corpo. Sendo assim, para sentir os efeitos dos estímulos da cafeína sobre sua personalidade, seria interessante ficar sem consumir café por um mês.






Ficando sem beber café por cerca de um mês, o indivíduo então poderá perceber que suas constantes oscilações de humor — ora motivado, cheio de energia, alegre, hilário e propenso a longas conversações; ora desanimado, às portas da depressão, para alguns, e sem vontade de conversar — são efeitos das várias doses diárias de café ingeridas por ele.



Para os dependentes da cafeína, a síndrome de abstinência, que se instala com a interrupção do uso e é caracterizada por mal-estar, dores de cabeça e irritabilidade, é passageira e dura até que o organismo se adapte novamente à condição de funcionamento natural sem os estímulos da cafeína.



Para os indivíduos não habituados à ingestão da cafeína, poderá ocorrer a intoxicação aguda caso as doses diárias sejam exageradas. Tal intoxicação será caracterizada por inquietação, nervosismo, excitação, insônia, rubor facial, rapidez no pensamento, alterações digestivas, contrações musculares, taquicardia e, em alguns casos, até arritmia cardíaca.
  

Para os atletas, principalmente os de maratona, os treinos condicionam o cérebro a produzir endorfina, que é uma substância responsável pelo bem-estar e pela promoção do bom humor. 



Essa endorfina produzida durante os exercícios também age como uma forma de gratificação sobre o corpo, e possibilita aos atletas treinados continuarem correndo mesmo após seu estágio máximo de cansaço, o que para um não atleta representaria parar imediatamente o exercício por ação da fadiga.



Se os atletas consumirem uma dose mínima diária de café (4 xícaras), os ácidos clorogênicos presentes na bebida exercerão um bloqueio sobre os receptores cerebrais que são estimulados pela endorfina. Desta forma, motivado pelo bloqueio promovido pelo café, o cérebro aprende a aumentar a produção de endorfina que estimula, num nível mais alto, o atleta a prosseguir durante a atividade física.








Treinando assim, os atletas acabam condicionando o cérebro contra uma resistência de absorção da endorfina, ocasionada pelo café. Logo, quando esta resistência for cessada, com a interrupção da ingestão do café, o cérebro estará condicionado a produzir mais endorfina, sem que haja qualquer resistência na absorção de toda ela pelo organismo.




A performance desses atletas poderá ser melhorada significativamente durante uma prova de maratona, sem que exista o "doping"; apenas com o aumento da capacidade natural do corpo de ir mais além, estimulado pela absorção integral de uma alta dose de endorfina. Porém, o Comitê Olímpico Internacional desclassifica os atletas que apresentam altas doses de cafeína no sangue durante a realização das provas.




Nas características relativas à prevenção de doenças, o café possui pontos positivos estabelecidos pelas comunidades científicas. Estudos feitos em pessoas sem qualquer doença, em países europeus e nos Estados Unidos, demostraram que, em períodos que variam entre 8 e 15 anos, a ingestão diária de café reduz os riscos de aparecimento do diabetes tipo 2 (não hereditário e que se manifesta na fase adulta), em relação aos indivíduos que não bebem café.




Foi constatado que o diabetes era ainda mais raro, quanto maior fosse a quantidade de café ingerido. Indivíduos que tomavam mais de 3 xícaras por dia (150ml) apresentavam menor índice de desenvolvimento da doença. "Por conta das pesquisas, podemos dizer que o café, ao que tudo indica, ‘protege’ as pessoas do diabetes", afirma o diretor da Unidade Clínica de Coronariopatia Crônica do INCOR, Luiz Antônio Machado César.




O médico do INCOR lembra que pesquisas realizadas em países escandinavos há alguns anos, mostraram que o café "podia causar infarto do coração", porém, Luiz Antônio esclarece que naquela região o café e fervido e tomado na água sem filtrar, ao estilo do café árabe. "Estudos mais recentes são bastante claros. Não existe o risco do café ocasionar infarto. Ele não protege diretamente, mas também não faz mal", garante o médico.



 



Quanto à depressão, alguns especialistas garantem que é menor a incidência de depressão e dependência química em pessoas que consomem café diariamente. "Isso se dá devido à cafeína e ao ácido clorogênico que atuam nas células nervosas e evitam que os componentes das drogas (lícitas e ilícitas) proporcionem a sensação caraterística de prazer", explica Darcy Roberto Lima, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e pesquisador da Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos.




O professor Darcy Lima, que acompanhou por uma década 106 mil estudantes de 10 a 20 anos em seis estados brasileiros, é especialista na bioquímica do café e entusiasta de suas propriedades nutricionais e farmacêuticas, sendo defensor da obrigatoriedade do café com leite na merenda escolar.



 
Na década de 1990, o professor Darcy acompanhou em regiões produtoras de café do Brasil, grupos de estudantes e constatou que os índices de depressão e obesidade entre os pesquisados eram muito menores do que em regiões onde alimentos calóricos e gordurosos predominam. "Como a obesidade é um dos fatores que pode determinar o desenvolvimento do quadro de diabetes, o café atuaria desde a infância como preventivo do problema", explica o médico.




Em relação à quantidade, os especialistas são unânimes ao afirmarem que não é bom exagerar. Eles afirmam que podem ser ingeridas até 4 xícaras de café por dia, dos 18 aos 65 anos, e, após essa idade, até 3 xícaras diárias. Acima desse limite, o café pode fazer mal, como qualquer outro alimento ingerido em excesso. Outra recomendação é a de que o café seja bebido durante o dia, a fim de se evitar a insônia.



O café deve ser consumido com cautela por gestantes, principalmente aquelas que são mais sensíveis à sua ação, já que possivelmente a ingestão de café ocasione contrações do útero, aumentando o risco de aborto espontâneo.




Dos tempos em que crescia selvagem nas montanhas africanas da Etiópia, há mais de 1500 anos, até os dias atuais, onde as prateleiras dos supermercados oferecem grande variedade de marcas, opções de consumo e até de sabores, o café, em meio aos seus prós e contras, segue absoluto e presente entre as opções de degustação nos quatro cantos do mundo. Aprecie com moderação.